Previdência não reconhece prática de pedir
revisão do benefício por tempo trabalhado após aposentadoria, mas decisão no
STF pode dar novo rumo ao debate
Prometida pelo governo federal em março, a Secretaria Nacional do Idoso
virou a esperança de associações e sindicatos para levar adiante o debate sobre
a desaposentação, mecanismo de revisão do valor da aposentadoria para quem
retorna ao mercado de trabalho. Embora o Ministério da Previdência seja contra
o conceito da desaposentação com o argumento de risco às contas do Instituto
Nacional de Seguridade Social (INSS), mais de uma vez representantes da pasta
admitiram que o fator previdenciário, criado em 1998 pelo governo de Fernando
Henrique Cardoso, transformou-se em um problema.
Inicialmente, o argumento era de que, com o aumento da expectativa de
vida da população, seria necessário criar um novo mecanismo que equacionasse a
questão, estimulando que a apresentação do processo de aposentadoria ocorresse
mais tarde. A fórmula leva em conta idade, tempo de contribuição e expectativa
de vida, mas teve efeito colateral indesejado: muitos trabalhadores continuaram
a se aposentar na mesma idade, mas, ao receberem um benefício mais baixo, se
viram forçados a continuar no mercado.
Para o presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores Aposentados e
Pensionistas da CUT, Epitácio Luiz Epaminondas, o Luizão, o tema tem de ser
esmiuçado em debates na Secretaria do Idoso, antiga reivindicação das entidades
e ainda sem data definida para ser criada. “O que o INSS faz hoje com o que
recebe das pessoas que já estão aposentadas e continuam trabalhando? Então,
precisa fazer um estudo com os pormenores para podermos entender como isso
funciona”, disse.
O debate sobre a revisão contempla a renúncia do benefício anterior e
com valor inferior, solicitando uma nova aposentadoria que contabilize as novas
contribuições. Procurado, o Ministério da Previdência afirmou por meio da
assessoria que não comentará questões ligadas à desaposentação porque a pasta
não reconhece o mecanismo.
Antonio Santo Graff,
diretor da Confederação dos Aposentados e Pensionistas do Brasil (Cobap),
aposta na disposição do governo para discutir os assuntos de interesse dos
aposentados na secretaria. Além da desaposentação e do fim do fator
previdenciário, ele aponta a necessidade de debater uma regra para o reajuste
dos benefícios acima do salário mínimo. “Com certeza é um assunto a ser
debatido dentro da secretaria”, disse. O grupo técnico de trabalho formado para
destrinchar os temas entre o Ministério da Previdência, Secretaria-Geral da
Presidência e sindicatos dos aposentados foi reativado, e a próxima reunião
será no dia 17 de maio.
Atualmente são mais de 500 mil aposentados que ainda trabalham com
carteira assinada, segundo o INSS. De acordo com dados do último Censo do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2010, a população
com faixa etária entre 60 e 99 anos soma 11% do total (20,5 milhões) – homens
idosos representam 5% e mulheres, 6%. Dez anos antes, os idosos representavam
8,6% da população (14,5 milhões). Com o aumento da expectativa de vida e a
redução da taxa de natalidade, estima-se que até 2020 o percentual de idosos no
país chegue a 13%.
Dois casos podem criar jurisprudência para cerca de 70 mil ações
semelhantes na Justiça, e estão aguardando apreciação no Supremo Tribunal
Federal (STF) – que reconheceu em 2011 a importância do tema e o incluiu na
pauta de julgamentos deste ano. O Recurso Extraordinário (RE) 661256 chegou a
ter seu julgamento iniciado em 2010, mas foi suspenso por um pedido de vista do
ministro Dias Toffoli. Até o momento, o quadro tem um voto a favor da
desaposentação. O INSS, que calcula impacto de R$ 2,8 bilhões por ano com todas
as revisões, aguarda o resultado para aplicar em suas decisões.
Alguns casos já obtêm êxito na Justiça, independentemente da referência
do Supremo. No início do mês, a Justiça Federal da Bahia determinou ao INSS a
revisão do benefício de J.A.R (com a identidade protegida a pedido do próprio),
auditor fiscal que se aposentou em 1991, mas voltou à ativa três anos depois ao
passar em um concurso público. O caso foi “emblemático”, de acordo com a
advogada que defendeu o auditor, Rafaela Carvalho. “Ele quis anular a sua
aposentadoria, que vinha recebendo desde 1989, então entramos com pedido de
desaposentação”, disse. A sentença era favorável desde o início, segundo ela.
“A Justiça só confirmou”, disse. O INSS chegou a recorrer da decisão inicial,
dada pelo Tribunal de Justiça da Bahia no ano passado. Porém, o juíz da 12ª
Vara Federal no estado, Carlos Alberto Gomes, determinou a desaposentação ao
auditor pelo regime próprio de previdência dos servidores federais.
As decisões judiciais são divididas, segundo Rafaela. A polêmica maior
em torno do tema se deve a um fenômeno ocorrido no início dos anos 1990, quando
a Previdência passou por um período de instabilidade. Temendo as mudanças
repentinas dos critérios para a apresentação do pedido de aposentadoria,
uma grande quantidade de trabalhadores pediu o benefício proporcional ao
tempo de serviço, mas continuou trabalhando. Hoje, muitos dos que optaram pela
garantia do benefício reclamam na Justiça a anulação da aposentadoria anterior.
“Eles argumentam que, com o que contribuíram até hoje, já daria uma
aposentadoria integral. Este caso é o mais polêmico, porque a maioria dos
juízes entende que o pedido de aposentadoria proporcional foi a escolha do
contribuinte”, disse a advogada. Dos casos semelhantes defendidos pelo grupo,
somente 40% tiveram sucesso.
Para o advogado previdenciário Pedro Dornelles, a decisão favorável
seria uma inovação não só para a aposentadoria por tempo de contribuição. “Por
exemplo, se uma pessoa está aposentada por invalidez e tem contribuição, pode
optar pelo melhor benefício. Seria uma vantagem para todos os segurados,
preenchidos os requisitos para aquele benefício”, disse.
A medida também é estudada no Congresso com a tramitação dos projetos de
lei 91, de 2010, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), e 2686, de
2007, do deputado Cleber Verde (PRB-MA). Os parlamentares afirmam que, com
a possibilidade de se desaposentar, o segurado amenizaria os efeitos do fator
previdenciário, mecanismo criado em 1998 durante o governo Fernando Henrique
Cardoso com objetivo de desestimular a aposentadoria precoce do trabalhador. O
governo já admitiu que a atual fórmula do fator – que leva em conta a idade,
tempo de contribuição e expectativa de vida – penaliza o contribuinte por
diminuir o valor do benefício para quem se aposentou com menos idade.
Fonte: Rede Brasil Atual